7.1.10

CAP. 6 - CONFIDÊNCIAS

O passado dói como uma eterna bofetada... mas o presente serve para esquecê-lo e do futuro espero dias melhores...

Ao chegar no famoso Dogão, pedimos nossos lanches e constatamos que os elogios de Vivian eram mesmo sinceros, pois o sabor agradava plenamente o paladar.

Durante o lanche pensei na camaradagem de Isabela e minha mãe e não pude evitar as lágrimas. Vivian logo quis saber por quê e respondi:

- Fiquei olhando sua mãe sendo tão gentil com a minha e me emocionei, minha mãe passou muito tempo na mais completa solidão.

Minha mãe interrompeu a conversa:

- Minha filha, acho que o momento não é o mais apropriado para falarmos de assuntos tristes!

Isabela interveio:

- É isso mesmo!! Vamos comer nosso lanche e no caminho paramos na antiga estação e conversamos com mais tranquilidade!

Terminamos nosso lanche e saimos caminhando rumo a tal antiga estação que Isabela comentou. Ao chegarmos lá, me deparei surpresa, era um velho galpão abandonado que no passado fora usado pela estação ferroviária da cidade.

Nos acomodamos nas muretas e minha mãe com olhar perdido começou a contar a Isabela sua vida.

"eu nasci numa cidadezinha pequena de moradores bem provincianos, as mulheres eram fadadas a uma vida politicamente correta, lavando, passando e cozinhando para o marido e os filhos! E na minha família não era diferente!

Éramos vizinhos de um casal que tinha uma filha de minha idade e que era a minha melhor amiga! Crescemos juntas e sempre muito unidas! Porém, na adolescência nos apaixonamos pelo mesmo rapaz, um jovem que havia chegado a pouco tempo na cidade e que logo se tornou o queridinho de todas as meninas!

O Daniel, era um cara charmoso, pele branca e olhos azuis, cabelos negros e ligeiramente compridos presos num rabo de cavalo com um corpo estonteante trabalhado diariamente na academia, era o tipo de cara que parava o trânsito e de quebra, ainda tinha a moto que fazia sucesso na época, a famosa garelli que era mesmo uma gracinha! Ele era um tipo playboy da época.

Não demorou, ele começou a me cortejar na escola, mas eu tinha receio por ele ser da turma da noite, estudava o segundo grau no técnico em contabilidade."

Nesse momento Vivian interrompeu:

- Técnico em contabilidade ? O que é isso ?

Isabela se zangou:

- Vivian, não interrompa!

Sem se importar com a interrupão, minha mãe respondeu:

- Na nossa época Vivian, quando terminávamos o primeiro grau que ainda era conhecido como ginásio, só tínhamos a opção de estudar magistério para sermos professoras ou íamos estudar técnico em contabilidade! O científico era opção somente nas grandes cidades!

- Entendi! Mas continue sua história, por favor!

Tomando fôlego, minha mãe continuou:

"Comecei a sair com o Daniel e me apaixonei, mas ele queria algo mais forte e que eu tinha receio devido aos costumes tradicionais da época! E foi aí que comecei a notar que ele andava estranho, estava sempre distante e sempre me deixando em casa mais cedo do que de costume.

Com medo de perder o amor dele, resolvi ceder ao que ele queria e logo me vi com ele entre quatro paredes. O que eu senti, foi um misto de satisfação e vergonha, a primeira por ter agradado meu amor e a segunda por ter certeza do desgosto que daria aos meus pais se eles descobrissem que agora não era mais virgem!

Cerca de duas semanas depois, senti que Daniel estava nervoso e tentava saber o motivo e ele sempre se esquivava. Ficamos nesse clima instável dois meses, quando notei que minhas regras estavam ausentes. Foi quando minha mãe também se deu conta disso e me levou ao médico, pois era comum atrasos de alguns dias, mas nunca de dois meses.

Nunca vou me esquecer da cara de desgosto de minha mãe, quando o médico anunciou que eu estava grávida de dois meses! Eu só tinha quatorze anos!

Meus pais procuraram por Daniel e o que ouvimos dele nos estarreceu, com ar desesperado, ele disse que não poderia casar comigo pois Janete também esperava um filho dele e que o pai dela, que era policial disse que o mataria se não assumisse seu compromisso com a filha dele!

Chegando em casa, pedi a Deus que me poupasse de dores mais fortes, mas o que vi diante de mim me encheu de pavor! Meu pai tirou o cinto e partiu para cima de mim, minha mãe adivinhando o que iria acontecer, entrou na minha frente gritando por socorro!

Atraídos pelos gritos, os vizinhos entraram em casa e uma senhora idosa, dona Geni me tirou de dentro de casa enquanto meu pai começava a jogar minhas coisas na rua. Ao me dar conta do que iria me acontecer, senti um pavor imenso, afinal, para onde eu iria, pelo amor de Deus ? Eu não tinha ninguém, conhecia perfeitamente bem os costumes da cidade e sabia que ninguém seria capaz de estender a mão para uma mãe solteira que naquela época era tachada como vagabunda!

Ajoelhei no meio da rua e chorando pedi clemência a meu pai, mas parecia que ele não me ouvia mais! Minha mãe apegada aos costumes tradicionais, ficou do lado dele mortificada por não ter coragem de enfrentá-lo.

Dona Geni, com a ajuda de outros vizinhos recolheram minhas coisas e envolveu-me num abraço carinhoso e me levou para sua casa. Aceitei sua oferta com gratidão, pois foi a única que me acolheu de braços abertos.

Para me ajudar, ela se mudou para uma casa mais afastada da cidade para que eu pudesse viver com mais tranquilidade e gerar o meu bebê que no começo eu queria abortar mas fui convencida a não cometer esse crime. E ainda bem que não fiz isso, olhe como a Andréia está linda hoje! É tudo o que eu tenho na vida, além de minha mãezinha do coração que ficou no interior.

Dona Geni me deu estudo e me ajuda até hoje com a Déia, tudo o que sou, o que tenho, eu devo a ela!

Estudei magistério e depois me formei em Pedagogia e com isso, me tornei independente! Minha filha tem de tudo, mas chegou uma hora que era preciso ir em busca de novos horizontes! A Deía precisa estudar e no interior ia ser dificil! Então decidimos que eu viria com ela para a capital e dona Geni ficaria no interior, pois acha que não se acostumaria com a vida na capital!

Isabela com os olhos úmidos, perguntou:

- E seus pais Cris ? Onde estão ?